“Comunicação e Misericórdia: um encontro
fecundo” é tema da mensagem divulgada hoje, 22, para o 50º Dia Mundial
das Comunicações Sociais. A celebração ocorrerá no dia 8 de maio, domingo que
precede a Festa de Pentecostes. No próximo dia 24 de janeiro celebra-se a
memória de São Francisco de Sales, patrono dos jornalistas.
O texto escrito pelo papa Francisco está em
sintonia com o Jubileu Extraordinário da Misericórdia. De acordo com o
Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais, a data quer ser ocasião para
refletir sobre as “sinergias profundas entre comunicação e misericórdia”.
O papa explica que “o Ano Santo da Misericórdia”
meditará a relação entre a comunicação e a misericórdia. “Com efeito a
Igreja unida a Cristo, encarnação viva de Deus Misericordioso, é chamada a
viver a misericórdia como traço característico de todo o seu ser e agir”,
escreveu Francisco.
Na mensagem, recordou, ainda, a importância do uso
correto das redes sociais para a promoção do bem comum. “As redes sociais são
capazes de favorecer as relações e promover o bem da sociedade, mas podem
também levar a uma maior polarização e divisão entre as pessoas e os grupos”,
disse o papa.
Confira:
Mensagem do Papa Francisco para o 50° Dia Mundial
das Comunicações Sociais
“Comunicação e Misericórdia: um encontro fecundo”
Queridos
irmãos e irmãs!
O Ano Santo da Misericórdia convida-nos a refletir
sobre a relação entre a comunicação e a misericórdia. Com efeito a Igreja unida
a Cristo, encarnação viva de Deus Misericordioso, é chamada a viver a misericórdia
como traço característico de todo o seu ser e agir. Aquilo que dizemos e o modo
como o dizemos, cada palavra e cada gesto deveria poder expressar a compaixão,
a ternura e o perdão de Deus para todos. O amor, por sua natureza, é
comunicação: leva a abrir-se, não se isolando. E, se o nosso coração e os
nossos gestos forem animados pela caridade, pelo amor divino, a nossa
comunicação será portadora da força de Deus.
Como filhos de Deus, somos chamados a comunicar com
todos, sem exclusão. Particularmente próprio da linguagem e das ações da Igreja
é transmitir misericórdia, para tocar o coração das pessoas e sustentá-las no
caminho rumo à plenitude daquela vida que Jesus Cristo, enviado pelo Pai, veio
trazer a todos. Trata-se de acolher em nós mesmos e irradiar ao nosso redor o
calor materno da Igreja, para que Jesus seja conhecido e amado; aquele calor
que dá substância às palavras da fé e acende, na pregação e no testemunho, a
«centelha» que os vivifica.
A comunicação tem o poder de criar pontes, favorecer
o encontro e a inclusão, enriquecendo assim a sociedade. Como é bom ver pessoas
esforçando-se por escolher cuidadosamente palavras e gestos para superar as
incompreensões, curar a memória ferida e construir paz e harmonia. As palavras
podem construir pontes entre as pessoas, as famílias, os grupos sociais, os
povos. E isto acontece tanto no ambiente físico como no digital. Assim,
palavras e ações hão-de ser tais que nos ajudem a sair dos círculos viciosos de
condenações e vinganças que mantêm prisioneiros os indivíduos e as nações,
expressando-se através de mensagens de ódio. Ao contrário, a palavra do cristão
visa fazer crescer a comunhão e, mesmo quando deve com firmeza condenar o mal,
procura não romper jamais o relacionamento e a comunicação.
Por isso, queria convidar todas as pessoas de boa
vontade a redescobrirem o poder que a misericórdia tem de curar as relações
dilaceradas e restaurar a paz e a harmonia entre as famílias e nas comunidades.
Todos nós sabemos como velhas feridas e prolongados ressentimentos podem
aprisionar as pessoas, impedindo-as de comunicar e reconciliar-se. E isto
aplica-se também às relações entre os povos. Em todos estes casos, a
misericórdia é capaz de implementar um novo modo de falar e dialogar, como se
exprimiu muito eloquentemente Shakespeare: «A misericórdia não é uma obrigação.
Desce do céu como o refrigério da chuva sobre a terra. É uma dupla bênção:
abençoa quem a dá e quem a recebe» (“O mercador de Veneza”, Ato IV, Cena I).
É desejável que também a linguagem da política e da
diplomacia se deixe inspirar pela misericórdia, que nunca dá nada por perdido.
Faço apelo sobretudo àqueles que têm responsabilidades institucionais,
políticas e de formação da opinião pública, para que estejam sempre vigilantes
sobre o modo como se exprimem a respeito de quem pensa ou age de forma
diferente e ainda de quem possa ter errado. É fácil ceder à tentação de
explorar tais situações e, assim, alimentar as chamas da desconfiança, do medo,
do ódio. Pelo contrário, é preciso coragem para orientar as pessoas em direção
a processos de reconciliação, mas é precisamente tal audácia positiva e
criativa que oferece verdadeiras soluções para conflitos antigos e a
oportunidade de realizar uma paz duradoura. «Felizes os misericordiosos, porque
alcançarão misericórdia. (...) Felizes os pacificadores, porque serão chamados
filhos de Deus» (Mt 5, 7.9).
Como gostaria que o nosso modo de comunicar e
também o nosso serviço de pastores na Igreja nunca expressassem o orgulho
soberbo do triunfo sobre um inimigo, nem humilhassem aqueles que a mentalidade
do mundo considera perdedores e descartáveis! A misericórdia pode ajudar a
mitigar as adversidades da vida e dar calor a quantos têm conhecido apenas a
frieza do julgamento. Seja o estilo da nossa comunicação capaz de superar a
lógica que separa nitidamente os pecadores dos justos. Podemos e devemos julgar
situações de pecado – violência, corrupção, exploração, etc. –, mas não podemos
julgar as pessoas, porque só Deus pode ler profundamente no coração delas. É nosso
dever admoestar quem erra, denunciando a maldade e a injustiça de certos
comportamentos, a fim de libertar as vítimas e levantar quem caiu. O Evangelho
de João lembra-nos que «a verdade [nos] tornará livres» (Jo 8, 32). Em última
análise, esta verdade é o próprio Cristo, cuja misericórdia repassada de
mansidão constitui a medida do nosso modo de anunciar a verdade e condenar a
injustiça. É nosso dever principal afirmar a verdade com amor (cf. Ef 4, 15).
Só palavras pronunciadas com amor e acompanhadas por mansidão e misericórdia
tocam os nossos corações de pecadores. Palavras e gestos duros ou moralistas
correm o risco de alienar ainda mais aqueles que queríamos levar à conversão e
à liberdade, reforçando o seu sentido de negação e defesa.
Alguns pensam que uma visão da sociedade enraizada
na misericórdia seja injustificadamente idealista ou excessivamente indulgente.
Mas tentemos voltar com o pensamento às nossas primeiras experiências de
relação no seio da família. Os pais amavam-nos e apreciavam-nos mais pelo que
somos do que pelas nossas capacidades e os nossos sucessos. Naturalmente os
pais querem o melhor para os seus filhos, mas o seu amor nunca esteve
condicionado à obtenção dos objetivos. A casa paterna é o lugar onde sempre és
bem-vindo (cf. Lc 15, 11-32). Gostaria de encorajar a todos a pensar a
sociedade humana não como um espaço onde estranhos competem e procuram
prevalecer, mas antes como uma casa ou uma família onde a porta está sempre
aberta e se procura aceitar uns aos outros.
Para isso é fundamental escutar. Comunicar
significa partilhar, e a partilha exige a escuta, o acolhimento. Escutar é
muito mais do que ouvir. Ouvir diz respeito ao âmbito da informação; escutar,
ao invés, refere-se ao âmbito da comunicação e requer a proximidade. A escuta
permite-nos assumir a atitude justa, saindo da tranquila condição de
espectadores, usuários, consumidores. Escutar significa também ser capaz de
compartilhar questões e dúvidas, caminhar lado a lado, libertar-se de qualquer
presunção de omnipotência e colocar, humildemente, as próprias capacidades e
dons ao serviço do bem comum.
Escutar nunca é fácil. Às vezes é mais cômodo
fingir-se de surdo. Escutar significa prestar atenção, ter desejo de
compreender, dar valor, respeitar, guardar a palavra alheia. Na escuta,
consuma-se uma espécie de martírio, um sacrifício de nós mesmos em que se
renova o gesto sacro realizado por Moisés diante da sarça-ardente: descalçar as
sandálias na «terra santa» do encontro com o outro que me fala (cf. Ex 3, 5).
Saber escutar é uma graça imensa, é um dom que é preciso implorar e depois
exercitar-se a praticá-lo.
Também e-mails, SMS, redes sociais, chat podem ser
formas de comunicação plenamente humanas. Não é a tecnologia que determina se a
comunicação é autêntica ou não, mas o coração do homem e a sua capacidade de
fazer bom uso dos meios ao seu dispor. As redes sociais são capazes de
favorecer as relações e promover o bem da sociedade, mas podem também levar a
uma maior polarização e divisão entre as pessoas e os grupos. O ambiente
digital é uma praça, um lugar de encontro, onde é possível acariciar ou ferir,
realizar uma discussão proveitosa ou um linchamento moral. Rezo para que o Ano
Jubilar, vivido na misericórdia, «nos torne mais abertos ao diálogo, para
melhor nos conhecermos e compreendermos; elimine todas as formas de fechamento
e desprezo e expulse todas as formas de violência e discriminação»
(Misericordiae Vultus, 23). Em rede, também se constrói uma verdadeira
cidadania. O acesso às redes digitais implica uma responsabilidade pelo outro,
que não vemos mas é real, tem a sua dignidade que deve ser respeitada. A rede
pode ser bem utilizada para fazer crescer uma sociedade sadia e aberta à
partilha.
A comunicação, os seus lugares e os seus
instrumentos permitiram um alargamento de horizontes para muitas pessoas. Isto
é um dom de Deus, e também uma grande responsabilidade. Gosto de definir este
poder da comunicação como «proximidade». O encontro entre a comunicação e a
misericórdia é fecundo na medida em que gerar uma proximidade que cuida,
conforta, cura, acompanha e faz festa. Num mundo dividido, fragmentado,
polarizado, comunicar com misericórdia significa contribuir para a boa, livre e
solidária proximidade entre os filhos de Deus e irmãos em humanidade.
Papa Francisco
Vaticano, 24 de Janeiro de 2016.Com informações da Rádio Vaticano.
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